Já não é sem tempo


“Tolerância zero” afirma coronel da PM

SARA OLIVEIRA
saraoliveira@oestadoce.com.br

O cenário é, literalmente, de guerra. Dias de Clássico–Rei no futebol cearense são de apreensão em Terminais de Integração e no entorno do estádio, que acabam sendo transformados em palco para brigas, confusão e, como no último domingo (14), até mortes. Duas pessoas foram baleadas, 193 torcedores (80 menores) foram apreendidos pela Polícia e 29 ônibus sofreram ações de vandalismo, antes mesmo de haver algum resultado que incitasse revolta. Considerando o raio de 5 km, que circunda o Castelão, outras duas mortes por lesão a bala foram registradas, no mesmo dia, do penúltimo jogo entre Fortaleza e Ceará, em 17 de março.
Números já quantificavam, a partir de uma pesquisa executada por um jornal esportivo, em 2012, que Fortaleza é a quarta cidade no ranking de assassinatos ligados ao futebol. As ocorrências – 14 mortes - compreendiam ao período entre 1988 e o mês de abril do ano passado. Após esta data, casos noticiados pela imprensa cearense somam, ainda, mais quatro mortes. Conforme a pesquisa, em todo o Brasil, no período estudado, foram 155 vítimas de guerras entre facções organizadas.
Na Capital, são cerca de seis grupos de torcedores que precisam do olhar atento da Polícia que, no último domingo, destacou 640 policiais para trabalharem durante o jogo, 220 dentro do Castelão e 420 no raio de cinco quilômetros no entorno do estádio. “Das pessoas apreendidas, ninguém tinha identidade, dinheiro ou ingresso. Antes, a ação policial só separava os possíveis agressores e eles iam embora. Agora, será tolerância zero”, afirmou o comandante do policiamento da Capital, coronel Carlos Ribeiro. No último Clássico-Rei, o número de pessoas apreendidas foi de, aproximadamente, 70.
ESCOLTA DAS FACÇÕES
Seis barreiras policiais (nas Avenidas Alberto Craveiro, Juscelino Kubtischek, Dedé Brasil e Paulino Rocha) são responsáveis por identificar grupos de torcedores. De acordo com o coronel, em três avenidas, há revista de todos os ônibus, vans e kombis que passam pelo local. “Próximo aos Terminais, todas as facções são escoltadas”, acrescentou Carlos Ribeiro. Após o jogo, nenhuma ocorrência foi registrada e apenas uma arma foi apreendida, justamente a que estava sendo portada por Francisco Romário da Costa, suspeito de ter atirado em dois torcedores do Fortaleza, no bairro Itaperi.

“Vamos colar nas torcidas, fazer valer o Estatuto do Torcedor. Estamos tentando, junto ao Ministério Público, fazer um regulamento que, em crimes de lesão e homicídio, a torcida envolvida seja anulada”, afirmou o coronel. Conforme ele, a problemática da insegurança e das ações de facções de torcidas não será destaque durante a Copa das Confederações, que acontecerá em junho. Para ele, o evento esportivo, “terá um público mais selecionado” e, portanto, a violência será minimizada.
Os dois assassinatos de domingo, segundo Carlos Ribeiro, após início da investigação, podem ter sido encomendados. “A linha de investigação aponta que a conotação do crime pode ser de encomenda”, afirmou. O encontro marcado entre torcidas, em redes sociais, pode ter sido o momento escolhido para que os assassinatos acontecessem. Até ontem, apenas um suspeito já estava preso e, ainda de acordo com o coronel, seu depoimento será essencial para desvendar os reais motivos do crime.
TRANSAÇÕES PENAIS
Tumulto, pedras atiradas em ônibus e viaturas e transporte de drogas foram as principais infrações cometidas pelos 193 torcedores conduzidos pela Polícia até o Juizado do Torcedor, que funciona dentro do Castelão. No local, com a presença de um juiz, um promotor e um defensor público, cada caso é analisado e, caso não haja nenhum processo criminal, são realizadas transações penais, que consistem em acordos entre infrator e Ministério Público para penas de prestação de serviço ou pagamento a entidades beneficentes.

Das 193 autuações, 83 resultaram em transações penais, sendo que 42 prestarão serviço e 41 pagarão dois salários mínimos a uma das seis instituições selecionadas. Outros 30 responderão a processo criminal e, entre os 80 adolescentes apreendidos, apenas quatro cumprirão medidas de internação. O procurador e coordenador do Núcleo do Desporto e Defesa do Torcedor( Nudetor), José Wilson Sales Júnior, reconheceu que o número de ocorrências, no domingo, foi superior ao último jogo. “Todo Clássico, esse número aumenta mais”, frisou.
Ele explicou que as sanções impostas estão previstas na Lei e que a fiscalização sobre o cumprimento das penas é realizada apenas de forma mensal. “A pessoa vai cumprir, por exemplo, na hora de um jogo, serviço em um hospital. No fim do mês, a instituição nos envia a lista de presença”, explicou. O procurador defendeu, ainda, a criação de um Juizado Especial do Torcedor permanente – hoje, o funcionamento é apenas plantonista- para que o monitoramento das penalidades seja mais eficaz.

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