Especial - Traduzido do Die Welt, em Portugal

EUA-Espionagem na Europa: Um escândalo com alto potencial explosivo

Angela Merkel com um telemóvel seguro na feira tecnológica de Hanover, em março de 2013.
Angela Merkel com um telemóvel seguro na feira tecnológica de Hanover, em março de 2013.
A colocação sob escuta do telemóvel de Angela Merkel prova sobretudo uma coisa: o descontrolo dos serviços secretos dos Estados Unidos, após os ataques de 11 de setembro, ganhou claramente proporções alarmantes.
É provável que Vladimir Putin tenha ido para a cama, na noite passada, com um sorriso de orelha a orelha. De facto, as revelações de que os serviços secretos norte-americanos terão escutado conversas telefónicas privadas da chanceler alemã começam por parecer uma brincadeira.
Um chefe de Estado europeu que nunca manifestou atitudes antiamericanas ao longo da sua carreira política, que defendeu fortemente o eixo transatlântico, é colocado sob escuta pelos norte-americanos? No Kremlin, devem ter-se rebolado a rir.
No entanto, na presente situação, esta notícia clamorosa não parece desprovida de fundamento. As reações da Chancelaria Federal e da Casa Branca sugerem que, pelo menos, a história revelada pelo Spiegel não é uma efabulação. Embora seja ainda muito cedo para avaliar a extensão do escândalo, temos já uma ideia de algumas questões que levanta.

Atitude paranoica

Que crédito dá o BND [os serviços secretos alemães] a essas escutas? Para começar, era bom saber a razão pela qual esta incrível “quebra de confiança” não foi descoberta pelas autoridades alemãs, mas por jornalistas. Considerará o BND que a colocação sob escuta do mais poderoso dirigente político da Europa é um caso de somenos importância?
Depois, há que perceber quem controla os serviços secretos dos Estados Unidos. Angela Merkel não é a primeira chefe de Estado a quem isto acontece. A Presidente do Brasil, Dilma Rousseff, está manifestamente na mira da NSA [os serviços de informação dos EUA] – e cancelou mesmo, em setembro, uma visita oficial aos Estados Unidos.
Passados poucos dias, o embaixador dos Estados Unidos em França foi convocado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros em Paris, porque havia suspeitas de espionagem industrial dos EUA, a coberto da luta contra o terrorismo.
A questão foi levantada por Peer Steinbrück, candidato às eleições alemãs, durante a recente campanha eleitoral. Muitos consideraram, então, uma atitude paranoica. Hoje, parece que era uma desconfiança mais do que legítima.

Coesão política ameaçada

O descontrolo dos serviços secretos a partir dos ataques de 11 de setembro ganha claramente proporções alarmantes
O facto de a República Federal da Alemanha ser tributária da proteção dos Estados Unidos, isso de forma alguma autoriza a potência protetora a colocar-se acima da lei e das regras diplomáticas. Nos Estados Unidos, o descontrolo dos serviços secretos a partir dos ataques de 11 de setembro ganha claramente proporções alarmantes. Este tipo de práticas mina os valores e a coesão política do Ocidente.
É muito cedo para avaliar as implicações políticas deste escândalo. Será ainda possível acreditar nos protestos de Washington, que alega não passar tudo de um mal-entendido? Provavelmente não. Quando os chefes de Estado são transformados em alvos, não se trata de um acaso, mas de uma estratégia cuidadosamente amadurecida. O caso das escutas da NSA pode ter repercussões políticas consideráveis e levar a um espetacular encontro de placas tectónicas dos dois lados do Atlântico.

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