BURACO BRASIL
MARLI GONÇALVES
Eu
bem poderia escrever, sei lá, sobre rock n`roll. Ou sobre a
possibilidade de enfrentarmos um grande e grave racionamento de água e
energia. Ou sobre os constantes atentados na Europa ou mesmo sobre a
bomba maldita voando sobre o Japão. Mas não dá. Sinto muito. Tem mesmo
de escrever sobre o buraco cheio de lama em que estamos atolados por
causa dessa gente, que agora, ainda por cima, deu de querer censurar as
coisas. Tem de reclamar, alertar a todos que estamos vivendo momento
perigoso, sombrio.
Que
pobreza! Não merecíamos isso. Um país bonito por natureza, cheio de
possibilidades, ficando para trás, cada vez mais trás, lá na
lanterninha.
Sabe
aqueles noticiários sobre inspeções surpresa que a polícia costuma
fazer nas celas das prisões em busca de celulares, armas e drogas?
Reviram os colchões pelo avesso, procuram túneis de fuga. Pois foi essa a
exata imagem que veio à minha cabeça quando soube que mais um - mais
um, dois, três, quatro, cinco, mil... - Ministro, desta vez o
multimilionário Blairo Maggi, estava com todas as casas por onde passa
sendo minuciosamente revistadas.
Repara
que não está sobrando um, e isso não pode ser normal. Não é normal. Não
podemos considerar normal, e acabar nos acostumando, o que aparenta
claramente já estar acontecendo. Tudo quanto é presidente,
ex-presidente, ministro, ex-ministro, mais os lacaios todos, os
asseclas... Pior: os do passado, do presente, e os de um futuro que
talvez até fosse possível, se é que deu tempo de pensarmos em alguém
novo e capaz.
Ou,
me diga, você ainda se choca com as cabeludas verdades, mentiras,
mentidos e desmentidos todo santo dia? Confessa: com cada vez mais
enrolados arrolados, já centenas de nomes, de empresas, pululam
delatores, se perde boa parte da história. Resta esperar o capítulo do
dia, que trará? Já nem sabemos mais exatamente sobre o que eles estão
falando.
O
país virou uma enorme Casa de Detenção. E passo a temer (não tenho nada
que o verbo também seja nome do homem) que nessa toada poderá ocorrer
rebelião.
E
o linguajar? São detalhes que talvez você nem preste atenção, mas por
conta até da profissão a gente aqui leva em conta, pega o detalhe.
Primeiro,
não parece que ninguém queira comunicar nada. Ou estão querendo falar
só mesmo com a meia dúzia que poderia vir a comandar essa rebelião ainda
possível? Querem falar apenas a essa classe média que anda por aí
batendo cabeça em grupelhos, e que estão parindo uns monstrinhos muito
dos esquisitos? Que até de censura gostam. Que se alimentam de ódio? Que
não entendem nada além do mundinho besta no qual se isolam, e vêm
palpitar e nos tirar o direito de decidir.
Como disse, talvez você não tenha reparado, mas, por exemplo, a última nota da presidência falava em realismo fantástico,
entre outras expressões pomposas num momento tão importante para quem
diz que tem como se defender. Fala logo, não enrola! E o outro, o preso
dos 51 milhões, que pede liberdade porque está com medo de ser
estuprado? Isso o povo entende direitinho. Fico imaginando os
comentários a respeito.
Momento esquizofrênico.
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Marli Gonçalves, jornalista – Comunicar
é arte que se faz, mas só com sinceridade; senão precisa falar, falar,
falar, para ninguém entender nada mas ficar achando que entendeu
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