A velha guarda morre mas não se rende

Idosos acima dos 70 anos têm super-representação partidária no Brasil

Dados do TSE revelam que 13,1% dos eleitores com mais de 70 anos são vinculados a um partido - índice acima da média da população: 8,2%. Especialista avalia que aumento da expectativa de vida leva a um interesse maior dos idosos pela política

Atualmente, são 146,4 milhões de brasileiros aptos a votar. Destes, 12 milhões estão acima dos 70 anos, ou seja 8,2% do eleitorado
Em um momento em que se discute a renovação não só na forma de se fazer política, mas na ânsia da sociedade pelo surgimento de novas lideranças, impressiona a quantidade de pessoas acima de 70 anos filiadas a partidos políticos. De acordo com levantamento feito pelo Correio, com dados divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em dezembro, das mais de 16,7 milhões de pessoas ligadas oficialmente a siglas no país, 2,2 milhões estão nessa faixa etária. Segundo especialistas, elas representam uma geração de pessoas que viveram a política mais intensamente.

Chama a atenção a super-representação partidária na faixa etária. Atualmente, são 146,4 milhões de brasileiros aptos a votar. Destes, 12 milhões estão acima dos 70 anos, ou seja 8,2% do eleitorado. A representação da faixa etária entre os filiados é de 13,1%. “Com certeza, há um desnível acima da média, mas é compreensível, considerando que essa geração viveu muita coisa em termos de política. Era jovem em 1964, quando começou o regime militar. Viveu as turbulências, as Diretas Já, a redemocratização. Um tempo em que a vida partidária era muito mais intensa e atraente”, comenta o professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer.

O professor aposta que grande parte das filiações foi feita há 20 ou 30 anos e está ativa até hoje. Além disso, ressalta que a expectativa de vida vem aumentando e isso faz com que os idosos se interessem mais pela política. “São outros tempos. Quem não tem interesse na política é essa geração dos 18 aos 30 anos, que não viu nada, não viveu o que os mais velhos viveram. O país está muito ruim, a economia, a falta de empregos e isso desestimula quem está começando a vida”, comenta Fleischer. Os jovens de 16 e 17 (quando o voto é facultativo) e de 18 a 20 anos representam 6,9% do eleitorado. Entre eles, somente 107.165 estão filiados, 0,6% do universo de pessoas associadas a partidos.

O professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Geraldo Tadeu Monteiro também ressalta as diferenças de gerações e afirma que, em média, os idosos são mais bem informados sobre política partidária e têm interesse superior ao dos jovens no tema. “Os políticos não investem muito nisso, mas os idosos representam um contingente importante dentro do eleitorado. Mobilizam-se mais que a média. Como muitos estão aposentados, têm mais tempo para ler, se informar, discutir e acompanhar o que os parlamentares estão fazendo. Quanto mais instruído e mais idoso, mais interesse”, diz Monteiro.

Já a presidente da Associação Brasileira de Gerontologia, Eva Bettine, discorda da visão de que os idosos têm mais interesse na política. “Essas filiações, se é que são verdadeiras, são reflexo de uma época que já passou. Quando a política partidária era mais efervescente. Hoje em dia, não percebo esse movimento”, pondera. O número de filiações divulgado pelo TSE é baseado na Lei nº 9.096/95, que determina que as siglas enviem à Justiça Eleitoral, em abril de todo ano, as novas fichas assinadas. Além disso, o sistema é atualizado mensalmente com os dados do Filiaweb, que também é alimentado pelos partidos. Não há um sistema de checagem dos dados informados pelas legendas.

O país fechou o ano de 2017 com mais de 16,7 milhões de pessoas filiadas a partidos políticos — um aumento de 85.821 em relação a 2016, quando pouco mais de 16,6 milhões estavam ligadas oficialmente a siglas. No ano anterior, de 2015 para 2016, o crescimento foi de 780.886, e a média dos últimos cinco anos foi de 316.574 novas filiações. Para especialistas, a queda na procura pelos partidos é sintoma da descrença com a política.

Para o presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, o momento, as revelações das distorções e desvios com o dinheiro público e o pouco trabalho das legendas em relação à comunidade faz com que o interesse diminua. “Há uma crise mundial em relação aos partidos. No nosso caso, é difícil ver um que esteja atuando para passar uma mensagem interessante, estimular a participação, criar ideias. Um ou outro movimento surgiu daquelas manifestações de 2013, mas não chega a induzir”, critica.
A faixa etária entre 45 e 59 anos ainda é a dominante no quesito, com 5,8 milhões de filiados. Com exceção do PSol e do Novo — que tem mais filiados homens entre 35 a 44 anos —, o restante tem nas idades a maior quantidade de associados. A faixa também representa a maior parte do eleitorado brasileiro, com 35 milhões de eleitores, 23,9% do total. Na avaliação do presidente do diretório nacional do Novo, Moisés Jardim, o partido não se separa em faixas, pois trabalha “como um bloco”. “Temos uma proposta de inovação e a principal forma de comunicação é por meio das redes sociais. Isso acaba atraindo um público mais jovem, mas não existem pautas divergentes. Somos um só bloco que conversa unificado em todas as faixas”, afirma.

Já o PSol se destaca pelo público mais jovem. A faixa predominante na legenda é entre 25 e 34 anos e a sigla foi a que mais cresceu em 2017 — com a filiação de 24.715 novos associados. “A gente se apresenta como um partido que tenta representar uma nova esquerda, que luta pelos direitos das minorias sem ter se corrompido. O nosso crescimento se deve ao reconhecimento à coerência. Uma nova geração de pessoas que se identificam com essa política encontram abrigo na nossa proposta. E velhos lutadores de movimentos sociais, desiludidos com o que há por aí, também veem uma opção na gente”, diz o presidente nacional da legenda, Juliano Medeiros.


Fonte - Correio Braziliense

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