Opinião

Jogo vital e pacto

Paulo Rosenbaum - médico e escritor
O pacto rejeita o oportunismo Um pacto não é poesia (ainda que a partir dele algum verso possa acontecer). Pactos são destinos compartilhados. Políticas de legitimação. O pacto favorece a atitude republicana e coloca na defensiva quem rejeita o entendimento. O pacto é um tratado que tira a prerrogativa do partidarismo. Pactos promovem acordos intersubjetivos. Ressonâncias acordadas. Pacto são diálogos que fluem na tentativa de compreender a interlocução. Pactos têm poder autêntico: combatem miséria, fome e opressão. Pacto é um arranjo, não é uma negociata. Pacto é consentimento, não acomodação. Pacto exige a presença de muitos. Pacto é um conluio entre vozes, conciliação. Pacto é cachimbo de paz. Pactos têm poder autêntico: combatem miséria, fome e opressão
Quando ouvimos que era chegada a hora do pronunciamento, havia uma expectativa e uma tensão que poucas vezes se viu no país. Havia alguém no comando? Quem estava governando? Hiatos assim jogam contra a República.  Todos aguardaram, queriam sentir e, se possível, experimentar qual era a mensagem. A maioria bufou um “ahh!!”. O gol perdido, uma chance desperdiçada, ou uma grande esperança que nunca se concretiza.
Sim, o povo é crédulo. Sim, as pessoas têm as melhores intenções de envolver-se nos pactos, mas não acatá-los sem compreendê-los. Sim, todos reconhecem que, gostemos ou não, há um jogo que foi jogado, e as regras devem valer até que se criem novas regras, ou o fim do tempo regulamentar. Pobre nova classe média, sem poder carimbá-la e com medo de perdê-la eleitoralmente, políticos e intelectuais se inquietam no afã de tachá-la com precisão. É difícil etiquetar o novo. E talvez eles estejam certos em silenciar mais uma vez. E se a nova classe busca, através da intuição, um caminho que ninguém percorreu? E se não for direita nem esquerda, para desespero dos maniqueístas da taxionomia?  
Há um jogo sendo jogado, e as pessoas não querem mais participar como  expectadoras, figurantes ou como equipe dos bastidores. Acabou-se o tempo em que se contemplava o rio sem querer provar da correnteza. A batalha é clara: que sejamos aceitos como protagonistas. Os principais, se não falha a memória. A quem mais o Estado deve obedecer? Mas é claro que se compreende por que tanto empenho.  Não se trata de simples campeonato ou Copa do Mundo; trata-se do jogo vital. O presente e o futuro de todos depende do desenrolar deste jogo vital. E ninguém mais aguenta ver árbitros oniscientes nem jogadores passivos.
Só podemos ser otimistas — e acreditar no grande teste para avaliar o estado de nossa democracia — se mantivermos o clima de paz. Quem não quer viver sem violência? Sem a miséria degradante das crianças? Sem a estupidez em vigor? Quem não declararia amor a uma cidade sem guerras civis abafadas pelas distorções da estatística? Quem não deseja que o vizinho não sofra as mazelas que sofremos? Quem não se sentiria melhor com florestas, índios e habitats protegidos e seguros? Quem não se inclinaria diante de um político ou estadista que abandonasse os privilégios e, como qualquer um de nós, cumprisse os deveres do cargo?Quem não se inclinaria diante de um político que abandonasse os privilégios e, como qualquer um de nós, cumprisse os deveres do cargo?
A chacoalhada foi geral. Não abalou só a classe política. O tremor intencional fez acordar a esperança de que não precisamos ser anônimos, sujeitos ocultos, ou zumbis que aceitam qualquer coisa. Houve uma mudança de degrau. A mudança que se impõe não é por mais, agora é por melhor, mais digno, mais justo. E os efeitos colaterais? Não há substância, em matéria médica ou sociológica, que não os apresente. Pois a transformação é também contra a tirania velada do tal “formador de opinião”. O autoritário, cantor, astro ou famoso que indica seu sucessor pode estar entrando em decadência. A autoeducação amplia muito a visão. Enfim, se enxerga com muito mais clareza a inconsistência quando somos mal dirigidos ou governados, e como é possível inverter os ritmos que antes pareciam ser nosso único destino.

Fortaleza, quem diria foi parar na capa do The New York Times.


'Fui tomar satisfação', afirma idoso que enfrentou PM em protesto no CE

Juiz diz que foi atingido por bombas de gás lacrimogêneo.
Polícia Militar não comenta o caso.

Carolina Esmeraldo Do G1 CE
Homem fica parado enquanto policiais se aproximam para conter manifestantes (Foto: Paulo Whitaker/Reuters)Homem fica parado enquanto policiais se aproximam para conter manifestantes (Foto: Paulo Whitaker/Reuters)
O senhor flagrado frente a frente com a polícia na manifestação desta quinta-feira (27), na Avenida Dedé Brasil, próximo à arena Castelão, afirma que, no momento da imagem, estava ''tomando satisfação'' por ter sido atingido por gás lacrimogêneo. Sílvio Mota, 68 anos, é juiz do trabalho aposentado e coordenador do Comitê pela Verdade, Memória e Justiça do Ceará. "Quem enfrentou a Ditadura Militar não sente muita coisa diante daqueles pobres desgraçados que estavam lá", disse, referindo-se ao momento exato da fotografia. A comissão do Ministério Público que acompanhou o protesto não havia constatado até esta quinta-feira (27) excessos da PM.
O homem afirma que chegou até o bloqueio porque a polícia jogou bombas de gás lacrimogêneo na manifestação, no local em que estava com a esposa, chegando a atingi-los. "Eu fui protestar. Eles me agrediram. Me levantei e fui tomar satisfações. Aquilo foi uma violação de tudo!", conta. A imagem foi capa da edição desta sexta-feira (28) da publicação norte-americana ''The New York Times''
No momento em que chegou ao bloqueio, Sílvio conta que os policiais não o receberam de maneira positiva. "Primeiro, eles tentaram dizer que eu não tinha direito de ir até eles. Depois tentaram me prender. Precisei mostrar minha identidade profissional, aí eles recuaram", afirma. De acordo com Silvio, ele se afastou para voltar à manifestação. Neste momento, os policiais lançaram projéteis de gás lacrimogêneo. "Vi cinco artefatos sendo jogados. Um deles pegou nas minhas costas", conta.
Sílvio conta que foi à manifestação com o objetivo de protestar a favor da reforma política através de plebiscito. "O Batalhão de Choque e a Polícia Militar em geral não reagiram a provocações. Eles chegaram para acabar com a manifestação", completa.
Durante a manifestação a Polícia Militar soltou bombas de gás lacrimogêneo para dispersar a multidão. "Tudo estava pacífico, mas a frente vinham cerca de 100 rapazes exaltados e esses foram que provocaram a confusão", afirmou o funcionário do Ministério Público, Alberto Bonfim.
Sobre o episódio envolvendo Sílvio Mota, a Polícia Militar informou que tem nada a declarar. A PM ressalta, ainda, que toda a ação da polícia foi legítima e acompanhada de perto pelo Ministério Público.
O protesto
Centenas de manifestantes caminhavam pela Avenida Dedé Brasil em direção à Arena Castelão pedindo mais investimentos em educação e saúde, redução do preço do ônibus e o fim dos gastos excessivos com a Copa, entre outras reivindicações, até que, ao chegar à primeira barreira policial perto da igreja evangélica Canaã, uma minoria quis forçar passagem.
A partir de então, o Batalhão de Choque avançou sobre os baderneiros que iam promovendo quebra-quebra à medida que recuavam. Um carro da TV Diário, emissora local, foi incendiado e outro, da TV Jangadeiro, apedrejado. Um ônibus que levava torcedores foi atacado por vândalos e os passageiros tiveram de descer.

Uma cerveja pra Battisti


STJ mantém condenação de Battisti; governo pode avaliar expulsão

Tribunal negou recurso; italiano é acusado de falsificação de documentos.
Advogado de ex-ativista disse que vai recorrer ao próprio STJ ou ao STF.

Mariana Oliveira Do G1, em Brasília

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou recurso do italiano Césare Battisti e manteve a condenação do ex-ativista  por uso de carimbos oficiais falsos do serviço de imigração brasileiro no passaporte.
A decisão foi tomada na última terça-feira (25) e divulgada nesta sexta (28).
A decisão do STJ deve ser publicada na segunda-feira (1º) e será aberto prazo de cinco dias para recurso. Ele pode recorrer ao próprio tribunal e, depois, também poderá questionar a condenação no Supremo Tribunal Federal (STF). O advogado de Battisti, Luiz Eduardo Greenghalgh, afirmou que deve recorrer ao STJ ou ao Supremo.
O Estatuto do Estrangeiro (lei 6.815/1980)  prevê a possibilidade de expulsão do estrangeiro que praticar fraude para permanecer no Brasil. A lei estabelece que a atribuição cabe "exclusivamente" ao presidente da República, mas decreto de 2000 delegou essa competência ao ministro da Justiça. O STJ enviou ao Ministério da Justiça cópia da decisão tomada para "providências que entender cabíveis". O ministério informou que ainda não foi notificado oficialmente.
Battisti foi condenado em 2010 pela Justiça Federal do Rio de Janeiro a dois anos de prisão, mas a pena foi revertida em prestação de serviços comunitários. O Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região já havia negado recursos e, agora, o STJ manteve a decisão da primeira instância.
Cesare Battisti foi condenado na Itália à pena de prisão perpétua, acusado de quatro homicídios. Em 2007, ele foi preso por ordem do Supremo e a pedido do governo italiano. Foi encontrado um passaporte francês com nome fictício e carimbo falsificado de visto de entrada no Brasil em sua residência no Rio de Janeiro. O Ministério Público Federal, então, denunciou o caso à Justiça. Battisti usou esse documento para entrar no Brasil em 2004.
O italiano alegou perseguição política, e o STF chegou, em 2009, a autorizar a extradição. O tribunal, porém, deixou a palavra final para o presidente da República. O então presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu em 2010 mantê-lo no Brasil. Em 2011, ele foi libertado da prisão. Atualmente, tem um visto de trabalho concedido pelo governo brasileiro.
Defesa de Battisti
O ex-ativista confessou a falsificação, mas argumentou nulidades durante o processo. Disse que não acompanhou depoimentos de testemunhas e outras questões processuais.
O STJ não chegou a reanalisar as provas e entendeu que Battisti foi devidamente notificado de depoimentos durante o processo.
De acordo com o advogado Luiz Eduardo Greenghalgh, que defende Battisti, caso seja aberto um processo de expulsão, haverá direito de defesa. "Aberto o processo de expulsão, na pior das hipóteses, ele tem direito de defesa. É um processo administrativo, levará tempo e não é uma coisa imediata."
Na avaliação dele, a condenação mantida pelo STJ e divulgada nesta sexta não muda a situação de seu cliente. "Acho que há uma desproporção entre o fato e a repercussão."
Direito internacional
O professor de Direito Internacional da Universidade de Brasília Márcio Garcia, que foi oficial de Proteção do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, esclareceu que se Battisti fosse refugiado, não poderia ser expulso. No entanto, o Supremo revogou a condição de refugiado concedida pelo governo brasileiro.
"Se ele estivesse na condição de refugiado, em tese, pode-se dizer que não poderia ser expulso. Isso porque o único país obrigado a aceitá-lo seria seu país de origem, a Itália. [...] Poderia ser uma extradição forçada", comentou.
A também professora de Direito Internacional da UnB Inez Lopez, ex-coordenadora de Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça, explicou que, por se tratar de estrangeiro sem refúgio, deverá ser adotado o Estatuto do Estrangeiro.
"A lei não determina a expulsão em caso de condenação, apenas prevê a possibilidade." Conforme Inez Lopes, o fato de a falsificação não ser um crime hediondo (grave) poderá contar a favor do ex-ativista italiano.

De como destruir um governo em 20 dias

Popularidade de Dilma cai 27 pontos após protestos

DE SÃO PAULO
Pesquisa Datafolha finalizada ontem mostra que a popularidade da presidente Dilma Rousseff desmoronou.
A avaliação positiva do governo da petista caiu 27 pontos em três semanas.


Hoje, 30% dos brasileiros consideram a gestão Dilma boa ou ótima. Na primeira semana de junho, antes da onda de protestos que irradiou pelo país, a aprovação era de 57%. Em março, seu melhor momento, o índice era mais que o dobro do atual, 65%.
A queda de Dilma é a maior redução de aprovação de um presidente entre uma pesquisa e outra desde o plano econômico do então presidente Fernando Collor de Mello, em 1990, quando a poupança dos brasileiros foi confiscada.
Naquela ocasião, entre março, imediatamente antes da posse, e junho, a queda foi de 35 pontos (71% para 36%).
Em relação a pesquisa anterior, o total de brasileiros que julga a gestão Dilma como ruim ou péssima foi de 9% para 25%. Numa escala de 0 a 10, a nota média da presidente caiu de 7,1 para 5,8.
Neste mês, Dilma perdeu sempre mais de 20 pontos em todas regiões do país e em todos os recortes de idade, renda e escolaridade.
O Datafolha perguntou sobre o desempenho de Dilma frente aos protestos. Para 32%, sua postura foi ótima ou boa; 38% julgaram como regular; outros 26% avaliaram como ruim ou péssima.
Após o início das manifestações, Dilma fez um pronunciamento em cadeia de TV e propôs um pacto aos governantes, que inclui um plebiscito para a reforma política. A pesquisa mostra apoio à ideia.
A deterioração das expectativas em relação a economia também ajuda a explicar a queda da aprovação da presidente. A avaliação positiva da gestão econômica caiu de 49% para 27%.
A expectativa de que a inflação vai aumentar continua em alta. Foi de 51% para 54%. Para 44% o desemprego vai crescer, ante 36% na pesquisa anterior. E para 38%, o poder de compra do salário vai cair --antes eram 27%.
Os atuais 30% de aprovação de Dilma coincidem, dentro da margem de erro, com o pior índice do ex-presidente Lula. Em dezembro de 2005, ano do escândalo do mensalão, ele tinha 28%.
Com Fernando Henrique Cardoso (PSDB), a pior fase foi em setembro de 1999, com 13%.
Em dois dias, o Datafolha ouviu 4.717 pessoas em 196 municípios. A margem de erro é de 2 pontos para mais ou para menos (RICARDO MENDONÇA)

Danilo Bandeira/Editoria de Arte/Folhapress
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Opinião

ELIO GASPARI

Um exercício de fantasia futurológica

Numa tarde em Brasília, o Supremo Tribunal Federal reúne-se para julgar os recursos dos mensaleiros, revoga as condenações por formação de quadrilha e livra-os do cárcere. Joaquim Barbosa, o presidente da Corte que relatara o processo, joga a toga sobre a bancada, faz um breve discurso, renuncia ao cargo, sai do prédio e chama um táxi. Dias depois, seu nome é lançado como candidato à Presidência da República. Há fantasia nesse cenário, mas o gesto da renúncia é uma possibilidade real. Se Joaquim Barbosa será candidato, trata-se de pura futurologia.
Quem duvida dessa possibilidade apresenta o que seria um obstáculo intransponível: a falta de base política. Alguém conhece pessoa que votará no candidato que for indicado pelo PMDB? Ter base partidária é mais uma carga do que um impulso, mesmo no caso do PT. Para a campanha da doutora Dilma, será bom negócio esquecer a estrelinha vermelha, fechando o foco na personalização de seu governo. O PT decidiu confundir-se com os mensaleiros. Problema dele.
Dos cinco presidentes eleitos nos últimos 60 anos, três prevaleceram sem que devessem qualquer coisa às bases partidárias. Fernando Henrique Cardoso foi eleito pelo Plano Real. Se dependesse da força do PSDB, seria candidato a deputado federal. Ele foi eleito porque o real ficou de pé. Depois do fracasso do Plano Cruzado, houve sete ministros da Fazenda e só ele teve futuro político.
Fernando Collor passou por três grandes partidos, mas elegeu-se pelo microscópico PRN, que não existe mais. Recuando-se aos anos 60, Jânio Quadros elegeu-se governador de São Paulo pelo irrelevante PTN e em 1958 foi engolido pela União Democrática Nacional num lance puramente oportunista.
Partido quem teve foi Lula. Todos brincam de cubos, formando alianças fisiológicas lubrificadas pelos métodos que desembocam em mensalões.
Olhando-se para a rua cheia de gente contra-isso-que-está-aí, vê-se um quebra-cabeça onde falta uma peça. Aécio Neves tem nas costas o doutor Eduardo Azeredo, com seu mensalão mineiro. Eduardo Campos não entendeu nada, disse que baixou as tarifas de transportes num ato "unilateral", como se fosse um coronel do semiárido falando aos peões de sua fazenda.
Joaquim Barbosa pode vir a ser a peça que fecha o quebra-cabeça. Se isso acontecerá, não se sabe. Também não se sabe que resultados trará. Os dois exemplos de avulsos que chegaram a presidente, Jânio e Collor, terminaram em catástrofes. No caso de Jânio, numa catástrofe que levou as instituições democráticas para a beira do precipício no qual elas cairiam três anos depois, em 1964. Barbosa defende grandes causas, mas é chegado a pitis e construções inquietantes, como a sua denúncia das "taras antropológicas" que a sociedade brasileira carrega. Descontrola-se e justifica-se atribuindo sua conduta a dores de coluna. Se todas as pessoas que têm esse tipo de padecimento perdessem o controle quando viajam em trens lotados na hora do rush, as tardes brasileiras teriam pancadarias diárias. Há nele uma misteriosa predisposição imperial.
Talvez esse exercício de futurologia tenha o valor de uma leitura de cartas. Sobretudo se o PT perceber que a ida dos mensaleiros para a prisão, ainda este ano, deixará de ser um peso nas suas costas. Afinal, depois que Fernando Haddad e Geraldo Alckmin acordaram o monstro, é difícil saber como levar a rua para casa, mas é certo que o monstro sairá de casa se os mensaleiros forem poupados.
Às 19h de quinta-feira, os manifestantes que estavam na Avenida Paulista em frente ao prédio da "Gazeta" mandaram que as bandeiras vermelhas fossem abaixadas: "O povo unido não precisa de partido". Minutos depois, queimaram algumas. Há 12 anos, elas estavam lá, gloriosas, festejando a eleição de Lula.

Opinião

VERISSIMO

Cadê o De Gaulle?

O "Journal du Dimanche" de Paris de domingo trazia uma entrevista com Daniel Cohn-Bendit, um dos lideres da sublevação popular que quase derrubou o governo francês em maio de 1968 e que continua atuando, como ativista e analista politico, com o nome que conquistou naquela primavera. Não é mais o irreverente Dani Vermelho de 45 anos atrás, mas ainda é o remanescente mais notório daquela geração que fez o então presidente de Gaulle pensar em largar tudo e se mandar. Só mais tarde ficou-se sabendo como o velho general chegara mesmo perto de renunciar. De Gaulle não era a única causa da revolta que começou com os estudantes e empolgou Paris, mas era um símbolo de tudo que os revoltosos não queriam mais. Se maio de 68 não sabia definir bem seus objetivos, pelo menos tinha um ícone vivo contra o qual concentrar seu fogo. Um conveniente símbolo com dois metros de altura, um nariz dominador e a empáfia correspondente.
A chamada de capa para a entrevista de Cohn-Bendit era "Um perfume de Maio de 68" e a matéria fazia uma comparação mais ou menos óbvia do que acontece no Brasil com o que acontece na Turquia e o que aconteceu nas recentes "primaveras" árabes e em 68 em Paris. Óbvia e inexata. Nos países árabes a rua derrubou ditadores, na Turquia a revolta é, em parte, contra um governo autocrático e inclui, como complicadora, a luta antiga pela hegemonia religiosa. E, diferente do maio de Paris, a combustão instantânea no Brasil ainda não produziu seus Cohn-Bendits nem tem um De Gaulle conveniente como um símbolo que resuma o que se é contra. Ser contra tudo que está errado despersonaliza o protesto. Qual é a cara de tudo que está errado? No Brasil tanta coisa está errada há tanto tempo que qualquer figura, atual ou histórica, serve como símbolo da nossa desarrumação intolerável, na falta de um de Gaulle. Renan Calheiros ou Pedro Álvares Cabral.
Na sua entrevista, forçando um pouco a cronologia, Cohn-Bendit diz que 68 foi o preâmbulo de 81, quando a esquerda chegou ao poder na França. Junho de 2013 será o preâmbulo de exatamente o quê, no Brasil? Aqui a esquerda, ou algo que se define como tal, já está no poder. O que vem agora? O Marx tem uma frase: se uma nação inteira pudesse sentir vergonha, seria como um leão preparando seu bote. Uma nação envergonhada dos seus políticos e das suas mazelas está inteira nas ruas. Resta saber para que lado será o bote desse leão.
Tempos interessantes, tempos interessantes.

Tá no rádiodomoreno.com.br